Governador Valadares

Etapas da recuperação

Obras em Estações de Tratamento de Água (ETAs), construção de adutora e recuperação de nascentes estão mudando a relação das comunidades com o rio Doce 

Governador Valadares

Três dias após o rompimento da barragem de Fundão, em 5 de novembro de 2015, a região de Governador Valadares, distante cerca de 330 quilômetros de Mariana (MG), na porção leste do Estado, experimentou o impacto da chegada da lama: o sistema de abastecimento da cidade ficou sete dias sem poder captar água do rio Doce, o que só voltou a acontecer em 15 de novembro. Mais de 260 mil pessoas ficaram sem água, e os reservatórios do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), autarquia municipal que administra os serviços de tratamento de água, esvaziaram.

“Lembro-me de que o Exército teve que intervir durante a distribuição de água mineral no centro da cidade”, diz Willy Alves, morador do bairro Turmalina, que sofreu com a interrupção do abastecimento de água na ocasião.

A captação de água no rio Doce só foi retomada no dia 15 de novembro, depois que o governo de Minas Gerais e a Prefeitura de Governador Valadares apresentaram um laudo que atestava a possibilidade do retorno do serviço. O SAAE realizou vários testes antes de liberar a captação, e os resultados mostraram que não havia metais pesados no rio, como a autarquia noticiou em comunicado: “A água distribuída estará dentro dos mais rigorosos padrões de qualidade para o consumo”.

Para o tratamento da água, foi utilizada uma substância coagulante chamada “polímero de acácia negra”, que acelera o processo de decantação, o que permitiu a separação dos resíduos presentes na água. Esse polímero foi utilizado com grande frequência nos meses seguintes ao rompimento.

homem em estação de tratamento de água

Em Governador Valadares, todas as cinco estações de tratamento passaram por reparos que garantem a qualidade da água. | Foto: Nitro Imagens

A interrupção da captação e o desabastecimento provocados pela passagem da lama chamaram atenção para as estruturas, algumas precárias, das Estações de Tratamento de Água (ETAs) dos principais municípios da região de Governador Valadares. Estudos de segurança hídrica apontaram os mananciais que poderiam ser utilizados para a captação alternativa nas cidades atingidas e se somaram ao diagnóstico das ETAs. Com esses relatórios, foi possível identificar as necessidades de cada região.

A Fundação Renova promoveu, até o momento, melhorias em 13 ETAs em Minas Gerais. Algumas estações tiveram que ser totalmente reconstruídas, como a do distrito de Perpétuo Socorro, também conhecido como Cachoeira Escura, em Belo Oriente. Em Valadares, todas as cinco estações de tratamento passaram por reparos que garantem a qualidade da água após seu tratamento.

“São obras cruciais, necessárias e que vão ficar como legado da reparação da bacia do rio Doce”, afirma Yone Melo de Figueiredo Fonseca, líder do Programa de Melhoria dos Sistemas de Abastecimento de Água da Fundação Renova.

O mapa das ETAs em Minas Gerais

ETA Senhora da Penha

Fernandes Tourinho (MG)

ETA São Tomé do Rio Doce

Tumiritinga (MG)

ETA Pedra Corrida

Periquito (MG)

ETA Tumiritinga

Tumiritinga (MG)

ETA Itueta

Itueta (MG)

ETA Alpercata

Alpercata (MG)

ETA Cachoeira Escura

Belo Oriente (MG)

ETA Resplendor

Resplendor (MG)

ETA Santa Rita

Governador Valadares (MG)

ETA Vila Isa

Governador Valadares (MG)

ETA Central

Governador Valadares (MG)

ETA Recanto dos Sonhos

Governador Valadares (MG)

ETA São Vitor

Governador Valadares (MG)

Em Governador Valadares, uma nova ETA será construída no bairro Santa Rita. Algumas etapas das obras incorporam desafios de engenharia. A instalação da nova unidade não poderá interromper a operação da antiga nem afetar o fornecimento de água para a região. “Os equipamentos e as peças da nova unidade da ETA de Santa Rita já foram adquiridos e estão armazenados na estação de Vila Isa. Temos algumas etapas a serem vencidas antes das obras, que começam neste segundo semestre e têm previsão de término em março de 2021”, afirma Alessandro Jerônimo, líder de Infraestrutura da Fundação Renova.

Já as ETAs da Vila Isa e Central serão completamente reformadas. Atualmente, estão sendo feitas obras maiores para a modernização dessas instalações. As intervenções nas estações de Recanto dos Sonhos e São Vitor encontram-se em fase final. 

Jerônimo acompanha os trabalhos que seguem nas ETAs de Governador Valadares. “Desde 2016, estamos trabalhando para modernizar, adequar e aprimorar as instalações das estações de tratamento existentes no município”, diz.

Alessandro Jerônimo

líder de Infraestrutura explica obras de captação

A captação alternativa

O rompimento da barragem de Fundão trouxe de volta um antigo problema das cidades da bacia do rio Doce: encontrar fontes alternativas de abastecimento de água. Em Governador Valadares, as obras de uma adutora, orçada em R$155 milhões, estão em pleno andamento.

“Sabíamos que a adutora sempre foi uma necessidade na cidade, até porque o rio Doce já estava bastante poluído e degradado antes mesmo da passagem da lama. Tínhamos esse sonho de poder captar água em outro rio que não fosse o Doce. Só assim teríamos a garantia de uma água de qualidade e de não ter que sofrer novamente o que sofremos em 2015”, afirma a professora Cleuza Maria da Silva.

O investimento na adutora de Governador Valadares está em torno de R$ 155 milhões

A adutora de Governador Valadares terá 35 quilômetros de extensão e permitirá a captação de água no rio Corrente Grande, entre Periquito e Governador Valadares, indo até o ponto de interligação com as ETAs da cidade, nos bairros Santa Rita, Vila Isa e Centro. A conclusão da intervenção está prevista para dezembro de 2020, e a entrega ao SAAE, após os testes e a operação assistida, será feita em março de 2021.

Raio X da adutora de GV

A adutora de Valadares terá 35 km de extensão

  • 13 km de tubulação enterrada
  • 22 km de tubulação aérea
  • 28 km de tubulação ao longo da ferrovia

População atendida: 240 mil pessoas

Vazão total: 900 litros/segundo

 

Situação atual (dados de julho/19):

  • Quase 3,5 km de tubos já instalados 
  • Cerca de 25 km de tubos armazenados nos 3 pátios da cidade

O cronograma segue dentro do estabelecido. Em julho, quando a obra completou um ano, mais de três quilômetros de tubos já haviam sido instalados. “Cerca de 25 quilômetros de tubos estão armazenados nos três pátios que foram montados na cidade. Isso equivale a 81% dos tubos necessários para o projeto. Além das frentes de trabalho já iniciadas – as situadas no trecho próximo ao aeroporto estão em processo de finalização –, outras duas também começaram em julho, no distrito de Baguari e na BR-381, próximo ao município de Periquito, onde acontece uma travessia não destrutiva (quando ocorre uma obra de perfuração sem que haja prejuízo para o ambiente ou para a rotina da rodovia)”, explica o gerente de Infraestrutura da Fundação Renova, Rodrigo Jurdi.

Essas intervenções deverão gerar até 550 empregos diretos e indiretos no pico dos trabalhos. Atualmente, mais de cem pessoas já estão trabalhando nessas frentes.

Outras ações, como a construção de sistemas alternativos de captação e adução e obras de saneamento em 39 municípios, que vão receber R$ 500 milhões da Fundação Renova para desenvolverem projetos de coleta e tratamento de esgoto, também estão mudando a realidade nessa região.

A recuperação de nascentes

As nascentes têm papel ambiental fundamental na recuperação de um rio e mesmo de uma bacia hidrográfica. Se elas estão preservadas, há boas chances de se restaurarem áreas degradadas, não apenas resgatando a biota terrestre e aquática, mas também garantindo a qualidade da água captada para abastecimento e consumo.

O Programa de Recuperação de Nascentes, que está em seu terceiro ano, tem como objetivo recuperar cerca de 5.000 nascentes em dez anos, além de uma área de 40 mil hectares ao redor desses olhos d’água, por meio do plantio de mudas e da regeneração natural. A infiltração da água no solo e a drenagem melhoram a saúde da água no rio, e o plantio, ao oferecer ao solo condições suficientes para reter as águas das chuvas, protege os mananciais e favorece a regeneração florestal.

homem pegando água de nascente

O Programa de Recuperação de Nascentes tem como objetivo recuperar cerca de 5.000 nascentes em dez anos | Foto: Gustavo Baxter / Nitro 

No primeiro ano do programa, 511 nascentes foram cercadas em parceria com o Instituto Terra, e 306 mil mudas começaram a ser plantadas. De acordo com o líder dos Programas Socioambientais da Fundação Renova, Lucas Scarascia, a iniciativa tem um efeito ainda maior quando se promove o engajamento de todas as partes no processo.

“É fundamental que os proprietários rurais entendam o quão importante é o programa e como a recuperação de nascentes é imprescindível para suas propriedades. Se as atividades de recuperação das nascentes forem acompanhadas de um processo educacional, de uma assistência técnica, essas ações poderão ser potencializadas no território, com a participação ativa do produtor rural e com o apoio de técnicos agrícolas, ambientais, agropecuários e florestais”, afirma Scarascia.

Em Itambacuri, no Vale do Mucuri, a 110 quilômetros de Governador Valadares, a propriedade de José Simplício teve uma nascente recuperada e preservada pela Fundação Renova. O trabalho de orientação feito pela Fundação Renova foi determinante para que agricultores da região se engajassem na recuperação do rio Doce.

Simplício relembra o estranhamento que sentiu quando foi informado de que poderia contar com o apoio da Renova para recuperar sua nascente. “Naquela época, não entendi o motivo nem sabia que a água da nascente aqui, da minha terra, poderia chegar ao rio Doce. Só depois me explicaram que a água dessa nascente vai para o córrego Pokim, que, por sua vez, deságua no rio Itambacuri, afluente do rio Doce”, afirma.

“Naquela época, nem sabia que a água da nascente aqui, da minha terra, poderia chegar ao rio Doce. Só depois me explicaram que a água vai para o córrego Pokim e deságua no rio Itambacuri, afluente do rio Doce.”

José Simplício, proprietário rural

Scarascia cita algumas medidas que podem contribuir para a preservação das nascentes, como a do proprietário José Simplício: “Conservar o solo, fazer uso controlado de defensivos e o cercamento das nascentes, promover o enriquecimento da vegetação, entre outras ações. Todas as técnicas de conservação do solo, além de ajudarem a evitar problemas como a erosão e a perda de fertilidade do terreno, colaboram para manter a provisão de água nas nascentes”.

Anualmente, os comitês de bacias hidrográficas e as prefeituras indicam propriedades com olhos d’água a serem protegidos. Scarascia cita a importância do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce) e da Câmara Técnica de Restauração Florestal e Produção de Água (CT-Flor) na construção do programa. “O apoio deles é fundamental no mapeamento de áreas prioritárias para a recuperação ambiental, no desenvolvimento e na aplicação de ações em restauração florestal da bacia do rio Doce”, diz Scarascia.

Família Sebastião Salgado

Nascente de propriedade rural sendo recuperada com ajuda do Instituto Terra, de Lelia e Sebastiao Salgado, que firmaram parceria com a Fundacao Renova para replantio de arvores e recuperacao de nascentes ao longo do Rio Doce | Foto: Gustavo Baxter / Nitro

Processo de restauração

O Instituto Terra, de Lélia e Sebastião Salgado, é parceiro no processo de restauração: Gustavo Baxter / Nitro

Nascente sendo recuperada

Na imagem, nascente sendo recuperada. | Foto: Gustavo Baxter / Nitro

Na primeira etapa de trabalho, as equipes da Fundação Renova fazem um diagnóstico da situação geral e providenciam cercamento para a proteção das nascentes. Na sequência, elas passam por manutenção, para que se garanta a preservação, e começam a ser monitoradas. O ano de 2018 fechou com 1.050 nascentes em algum desses estágios.

Nascentes Recuperadas

Localização: Minas Gerais: Itambacuri, Campanário, Jampruca, Frei Inocêncio, Coimbra, Governador Valadares, Periquito, Galileia, Ponte Nova, Resplendor, Guanhães, Sabinópolis e Virginópolis

Espírito Santo: Colatina, Governador Lindenberg, Pancas, Marilândia, São Roque do Canãa, Linhares e Rio Bananal

Educação ambiental

A Fundação Renova tem investido na educação ambiental das comunidades que vivem nos municípios impactados pelo rompimento da barragem de Fundão. Esse trabalho é realizado em escolas das redes municipal e estadual. O objetivo é fazer com que a nova geração ajude a pensar o futuro do rio Doce. Ao mesmo tempo, os alunos se informam sobre ações realizadas pela Renova, como o monitoramento da qualidade da água do rio Doce, por exemplo.

Já foram promovidas oficinas de reflorestamento em Bugre (MG), no Vale do Rio Doce, com a participação de 230 alunos. Outra atividade de educação ambiental, tendo como foco a água e o monitoramento do rio Doce, mobilizou 330 alunos da comunidade de Ipaba do Paraíso, em Santana do Paraíso (MG). Além dessas ações, jovens participaram do plantio de mudas de espécies nativas em Galileia (MG) e Tumiritinga (MG). Também estão previstas atividades em escolas dos municípios de Sobrália (MG) e Fernandes Tourinho (MG).

José Armando de Figueiredo Campos é presidente do conselho diretor do Instituto Terra

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